18.10.10

Desconfiança do Vazio 2

Injustiça fazer meus raríssimos leitores esperarem mais de uma semana para o término de um continho de nada... Desculpem. Quem dera eu ter o talento e a oportunidade de viver apenas do escrever. Atividade ingratamente reconhecida nessa país... Bem, quando o trabalho e a pós permitirem volto com mais alguma coisa. Espero não demorar uma semana novamente.


Nada neste saguão de entrada. As únicas cores eram as dos vitrais da porta de entrada. Corredores vazios. Um para frente, um para cada lado. Bloqueados por portas de madeira, pintadas de branco, pareciam ser de compensado. Droga. Deve ser para frente. Agora penso, porque raios achei que era para frente?
A porta estava aberta. Outro corredor. Branco. Portas nas duas paredes, várias, indistintas. Um homem de feições emagrecidas estava sentado em um banco de madeira, tipo de praça de cidade pequena. Seu tronco balançava para frente e para trás. Cabelos raspados, cuja aspereza de seu crescimento relevava uma meia idade grisalha. Pois, não tivesse visto isso, arriscaria dizer ter idade para uma cabeleira inteiramente alva.
- Senhor?
Ele continuou balançando.
- Senhor? - encontei-lhe no ombro.
Parou por alguns segundos. Ergueu os olhos. Quase caí de costas. Era um olhar tão vazio! Tão vazio! Por um momento senti que mergulharia nele, ou seria tragado para dentro. Afastei-me. Ele continuou a balançar.
Por de trás de algumas portas ouvia batidas, gemidos, às vezes gritos. Um homem passou por mim. Carregava baldes. Tentei falar-lhe, não deu tempo. Parece nem ter notado minha presença.
Ao atravessar a porta seguinte (semelhante à anterior) saí em um grande salão. Algumas pessoas andavam aleatoriamente, arrastando os pés, quietas, outras falavam sozinhas. Alguns assistiam televisão. Outros estavam sentados a mesas. Um parecia jogar damas sozinho. Sim! Quatro pessoas de jaleco branco. Deviam ser funcinários. Eles me ajudariam, sem dúvidas. Dois estavam sentados a um balcão olhando para o nada, uma estava à janela, olhava para algo do lado de fora (será que procurava o nada que não habitava ali?), outro folheava uma revista (no máximo estaria olhando para as figuras)
Quando dei dois passos para dentro um homem começou a gritar.
- Quero cigarro!
Algo ainda existia ali dentro dele! O cigarro!
- Quero MEU cigarro!
Um enfermeiro levantou-se e a enfermeira atentou-se. Ambos foram na direção do rapaz. Altura mediana. Cabelos muitos pretos, revoltos. Barba bem aparada. Rosto quadrado. Descrição toda que compunha de forma estranha com aquela bata de interno que estava usando, sobrecimada por uma jaqueta preta.
Quando os dois se aproximavam, ele subiu no sofá, espantou outros pacientes. Olhou na minha direção. Olhar profundo. Decidido? Esperançoso? De socorro? Pulou por cima da mobília no momento exato em que seria apanhado. Correu pela sala derrubando pacientes, cadeiras. De repente estava sobre mim. Segurou-me pelo colarinho, quase ergueu-me e gritou:
- DÁ MEU CIGARRO! POR FAVOR!
No momento seguinte eu era puxado pela frente. Não dava para entender muito bem o que estava acontecendo. Ele se debatia. Uma mão não largava minha camisa. Segurou-a com intensa força, enquanto era puxado para trás por dois homens de branco. Ao tentar se libertar dos homens segurou-me nos ombros. Por um segundo olhou-me dentro dos olhos. Desespero! Meu? Dele? Atrás da retina havia algo além do vácuo! Cada um foi puxado para um lado. Dois botões da camisa arrebetaram. A mão dele escorregou e no que se corpo oscilou para trás, seu braço foi pego por um homem, que imediatamente injetou-lhe algo. Ainda pude ver o sangue escorrer-lhe antes de o levarem para o outro lado da sala e sumirem por uma porta enquanto eu ofegava, tentava recompor minha roupa e alguém tentava acalmar-me, desculpar-se, com uma mão em minhas costas e a outra em meu braço.
Aqueles olhos negros impregnaram-se em minha córnea! Não vi para onde fui conduzido. Apenas vi que fui colocado sentado em um poltrona confortável. Dada-me água com açúcar. Na minha frente uma moça, formalmente vestida.
- Apenas queria entregar isso.
Entreguei o envelope. Ela o abriu, viu do que se tratava (o que seria?) e agradeceu. Pedi pela saída. Ela indicou-me, oferecendo-me milhões de desculpas etc. Andei por um corredor, no qual passei pela porta em que entrei. O homem com os baldes trancava a porta de vitrais. Ao terminar o corredor saí na recepção, cuja porta de entrada era na lateral do prédio mais próxima da guarita.
Bom... foi assim que conheci aquele prédio. Não entro mais lá nem por pagamento. É impressionante como é tudo vazio. A grana, as paredes, os pacientes, os funcionários.... Vazio.... Mas naquele homem, naquele que entrou em minha alma, talvez para que eu visse a dele, nele havia algo trancado lá dentro, pedindo para sair.
- Impressionante. Realmente acho que não se trata alguém trancafiando assim.
- É! Chegamos.
- Quanto ficou?
- Vinte e sete. Pode dar esses vinte e cinco, está ótimo. Boa viagem apra o senhor.
- Obrigado. Tudo de bom para o senhor. Ah! Cobrou essa bagunça daquela a quem fez o favor?
- Estou indo lá agora... vai ficar um pouco caro! Se é quem me entende...
- Ah! Ok! Boa sorte.

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